domingo, 26 de abril de 2009

Fonte de Inspiração

A idéia inicial para criar este blog foi escrever sobre coisas que não achava espaço em outro lugar. Meus sonhos, meus desabafos ou minhas impressões sobre qualquer coisa, sobre um filme ou livro, ou outras coisas, boa ou ruim.
Uma delas são os filmes que gosto. Nem todos são daquele tipo que todos achariam bom, mas gostos não são iguais e quanto a eles não se discute (muito, rs). Por ter um gosto não muito comum (bruxas, filmes e jogos de terror, mística e afins...) sempre acho dificuldade em encontrar espaço para comentar minhas impressões, seja no meio virtual, seja entre amigos mesmo.
Bem, vou começar com o primeiro filme com o qual sempre tive vontade de fazer isso e que sei que é pouco (e talvez totalmente) desconhecido, mas que me influenciou muito em muitas coisas que escrevi e se enquadra com aquele tipo favorito dentre os que assisti e que até hoje ainda assisto como se nunca fosse enjoar dele.

Foi em 1999, no auge dos besteiróis americanos, com filmes de “terror teen” como Pânico e Eu sei o que vocês fizeram no verão passado, além de outras imitações piores, apareceu um outro filme que chamava a atenção no cartaz por ser do mesmo autor dessa última tranqueira ai (“Eu sei...”). Esse foi o único motivo pelo qual meu irmão alugou Eu Estou esperando por você, um thriller também de adolescentes e que pela sinopse (enganosa) também pode parecer um besteirol como os outros, mas o fato de ter sido pelo mesmo autor e coisa e tal não o transformou na mesma matéria dos outros, pelo menos para mim.
A sinopse do filme foi feita provavelmente por alguém que não só não assistiu o filme como também queria colocá-lo em evidencia pelos mesmo motivo que fazia os outros terem sucesso: muitas mortes, muito sangue, muito “medo”. Mas diferente dos besteiróis de sucesso, estes elementos “clichês” não faziam parte desse filme e poderiam decepcionar quem o alugou só por este motivo (como lembro até hoje a opinião negativa do meu irmão e quando eu perguntava porque ele dizia “É um filme chato, não tem mortes, não acontece nada.” , eu ria, pois o “nada” para ele era só o ‘não tem ninguém sendo estripado ou decepado ou morrendo das formas mais ‘criativas’ que o cinema pode proporcionar’ e isso podia mesmo ser muito chato para quem só esperava isso desse filme).

Quando fiz uma cópia desse filme para mim, criei uma capinha diferente da chamativa e oficial de locadora e fiz uma sinopse mais verdadeira da história também, que seria basicamente isso:
“Sarah Zoltaine (Sarah Chalke, a Dra. Raid no seriado Scrubs) mudou-se recentemente com sua mãe, Rosemary (Markie Post) para uma velha casa na pequena cidade de Pinnecreast, Massassuchest. A lenda da casa que circula por toda a cidade é que há 300 anos uma garota chamada Sarah, que também viveu lá, foi queimada por bruxaria e como ultimas palavras lançou uma maldição jurando voltar para destruir todos os descendentes de seus assassinos. Agora acredita-se que a nova Sarah seja a reencarnação desta bruxa.”
Se a sinopse fosse só isso numa capa oficial de locadora, provavelmente só os mais interessados iriam querer assistir.

Baseado no romance “Gallows Hill” (não traduzido, que eu saiba, no Brasil, infelizmente) de Lois Duncan, esse filme tem vários elementos inspiradores e encantadores para mim: o clima frio de outono, o céu quase sempre nublado e com aquela sensação úmida no ar, as músicas (ou ritimos) combinando com esse clima, a história de bruxas numa época que este interesse florescia em mim (e que ainda hoje é o melhor de bruxas que já assisti), a sagacidade da protagonista, numa época em que elas eram apenas mocinhas que corriam de assassinos mascarados (embora exista um 'mascarado', ela não corre dele, rsrs).
Uma das primeiras coisas que notei de diferente neste filme foi como ele parece simples e um tanto verídico. Não há aquela “luz de estúdio” — que tira um pouco aquele tom de noite ou de mistério ao lugar — quando o clima é escuro, apenas com a ajuda de uma lanterna é possível ver o cenário durante essas cenas. Isso devia ser mais usado, dá um tom bastante diferente.
Os diálogos mãe-filha também são interessantes, o sarcasmo e a afeição afiados:
“Como foi hoje? – pergunta Sarah à mãe depois de seu primeiro dia como professora na cidade.
—A carinha dos alunos da 3ª série são lindas, um até me deu uma maça pelo meu primeiro dia!
—Nunca é cedo para aprender a arte da puxação de saco. –responde Sarah sarcástica. A mãe a olha aborrecida.
—Hmmm...quando se tornou uma convencida? Quando eu não estava olhando?
A filha dá um sorriso ardiloso ao responder:
—É quando tudo acontece.

Sarah é uma garota de cidade grande (Los Angeles) que se muda para a pequena cidade de Pinnecreast e tem problemas com os habitantes locais, principalmente no famigerado mundo escolar. Com suas roupas diferentes — vestidos longos, toucas, amuletos e cristais, e aquele sobretudo vermelho escuro estiloso — ela chama a atenção do povo interiorano, principalmente as patricinhas locais, que são uma espécie de fabricação em massa, com um estilo basicamente igual, seguida por toda uma classe de pessoas — principalmente os grupos populares ou os que tem a ver com esportes (maioria) que lhes dá uma espécie de status num lugar sem muitas atrações (isso lembra o lugar onde eu moro, rsrs, interior é uma b%¨&$ mesmo...) — além de sua suposta relação com a lenda da bruxa local, que a torna ainda mais alvo da aversão e comentários maldosos.

“A verdadeira maldição de Pinnecreast são as mentes obtusas. Qualquer pessoa um pouquinho diferente tem de ser, sei lá, filho de satã.” – diz Charlie, enquanto passeiam pela cidade, numa manhã ensolarada de outono. Charlie (Ben Foster, o Anjo em X-Men 2) é outro cara deslocado (de Nova York), o nerd da turma, o que sempre será zoado pelos valentões e populares, do qual as garotas sempre rirão. Ele tem uma loja esotérica na cidade e vira amigo de Sarah (por quem tem uma queda a primeira vista) quando ela vai à sua loja comprar algo para melhorar o ambiente pesado de sua casa. Lá ele a deixa a par da história de sua casa:
“Salem (também em Massassuchet) foi muito falada na imprensa, mas também tivemos nossa bruxa. Há 300 anos, cinco homens a arrastaram daquela casa e a queimaram no patíbulo, onde costumavam enforcar os criminosos. E esse local fica bem pertinho do seu novo “lar doce lar”. E quando estava sendo devorada pelas chamas prometeu que voltaria e puniria todos os descendentes um por um. Bem-vinha a Pinecreast, um bom lugar para criar os filhos.”

Mas Charlie não é o único a se interessar por Sarah na trama. Temos Eric (Christian Campbell), que faz parte do “Grupo dos Descendentes”, aqueles que estão na geração amaldiçoada pela bruxa. Ele é o tipo “mais popular entre os populares”, namora a patricinha arrogante da cidade que é a melhor amiga da ‘patricia-mor’ e vaidosa da escola. Logo no primeiro dia de aula Sarah chama sua atenção, ao ler um livro de quiromancia perto dele.
—Ah, leitura de mão...se interessa? – indaga ele tentando um primeiro contato com a garota.

O interesse de Eric é duplo. No grupo dos descendentes, a suspeita é que Sarah seja a tal reencarnação da bruxa que apareceria naquele ano para puni-los. Ao perceberem um certo interesse de Sarah por Eric, usam-no para tentar tirar algo que possa incriminá-la.
"A bruxa que devia voltar esse ano se chama Sarah.
— E daí, acham que eu sou a bruxa?
— O que você acha?"
E ao mesmo tempo, Eric, mesmo namorando a nojenta Kyra (Soleil Moon Frye, a Punky - Levada da Breca dos anos 80) sente uma atração pela misteriosa Sarah, mesmo dividido entre colocá-la em situações constrangedoras (de brincadeiras de mal gosto até tentativa de afogamento) para o bem do seu grupo e ajudá-la, cedendo a sua afeição.

—Mas eu odeio festas! – diz Sarah aflita, após ser convidada a participar como vidente (aproveitando-se da sua fama de ‘bruxa’ na cidade, embora fosse tudo uma brincadeira) em uma daquelas festas estilo americano. Eric a tranqüiliza:
Mas essa...essa você vai adorar.
—Mas eu não conheço ninguém.
—Pois é né...conhece a mim. –depois rola um beijo em close muito romântico seguido de uma trilha que dava um tom sereno a cena e não melosa ou apelativa. Foi bastante simples e bonitinha, com os balões de festa no fundo.
No decorrer da trama as coisas começam a complicar e o que Sarah pensou que fosse apenas uma história do interior que rondava pelas redondezas, começou a se tornar mais sério e perigoso do que ela imaginava.

“Acham mesmo que uma bruxa velha de 300 anos invadiu o meu corpo enquanto eu estava...dormindo, para levar vocês do clube dos descendentes para a morte? É isso mesmo que acham?” – indaga a garota desesperada depois que as coisas começam a se voltar contra ela. As pessoas começam a evitá-la e a trata-la mesmo como uma bruxa:
“Alho, seus idiotas, é pra vampiro! Não acreditam? Perguntem a Buffy. Ninguém aqui assiste televisão?” – numa alusão ao seriado da famosa caçadora de vampiros Buffy (curiosamente também uma “Sarah” Michelle Gellar).
“Problema de adaptação? Não ser escolhida para a comissão de festas é que é um problema de adaptação. Mas ser acusada de assassinato premeditado e feitiçaria. Isso sem falar do meu envolvimento com incêndios. Eu acho que a coisa é um pouquinho mais complicada!” – irrita-se a garota com o seu professor de história quando este tenta contornar as brincadeiras de mal gosto feitas contra ela na escola (como a bruxinha de brinquedo com uma risadinha maligna deixada próxima a ela com um bilhete dizendo “Queimem a bruxa!”).

Esse é um filme diferente. Pode ter ares de beiteirol para alguns, mas ele conseguiu me tocar no intimo com todos os elementos dos quais eu mais gosto, me envolvendo como nenhum outro conseguiu fazer. Além disso, de certa forma eu me identificava com a protagonista, que aproveita as horas sem a mãe em casa para fazer coisas que você só consegue fazer quando está sozinho, por mais bobo que seja, como colocar a musica que quiser para tocar, imitar uma cantora sedutora no espelho e fingir que a vassoura na verdade é o microfone e o par de dança (deslizando pelo soalho de meia? Referência a clássica cena de um jovem Tom Cruise em Negócio Arriscado (1983)), ou o modo como ela se questiona sobre si mesma "Tenha coragem Sarah, é uma experiência de crescimento interior, todos devem aprender a nadar. Vai ser útil no futuro. Se é que existe um futuro." - murmura ela refletindo sobre o fato de não saber nadar enquanto caminha ao redor da piscina.

É um filme para quem gosta de bruxas, mas também para quem gosta de originalidade e uma pitada de sarcasmo numa protagonista que não correrá de um mascarado, mas, antes de mais nada, tentará sobreviver no meio da hostilidade adolescente sendo ela mesma. Não é um contra todos como os habituais filmes da época. É todos contra um.

"Quanto a Sarah Lanchaster? Bem...ela voltou. Porque promessa, é dívida."